C. Grégoire Scalabre
"L’ultime métamorphose de Thétis", "Cygnus" e "L’onde"
Grégoire Scalabre é um ceramista completo. Cada uma das suas esculturas é um achado, um objeto espetacular de concentração e imaginação que ultrapassa as fronteiras tradicionais das disciplina para se impor nos eventos de arte contemporânea em França e no estrangeiro. Fruto de um longo trabalho metódico, cada peça demonstra várias técnicas ao serviço de texturas e formas inéditas. Nascida de uma assiduidade que raia a meditação, a obra desenvolve-se com fôlego e mistério.
O atelier é o espaço da criação. Ao centro, a obra toma forma graças à montagem de uma série de peças realizadas uma a uma pelo artista. Numa longa bancada, repousam belos cadernos repletos, enquanto muitas das suas páginas estão expostas na parede. Existem desenhos à mão livre, perspetivas, esboços... Cada forma parece ter de ser representada de todos os ângulos, como se as mãos tivessem de dominar primeiro a imagem do objeto antes de pegar no material.
Grégoire Scalabre cria da mesma forma que respira, livremente. Mestre das várias técnicas cerâmicas, é capaz de imaginar tudo, sobretudo o incrível, abrindo o seu registo de expressão às mais diversas formas e texturas em busca de um vocabulário único e evolutivo. Ele quer que o espectador questione, que duvide daquilo que vê. É pedra? É porcelana? É borracha? Jogando com os efeitos da superfície, o ceramista apaga o seu rasto e engana os sentidos para dar ao material uma superfície, uma amplitude e uma profundidade inesperadas. As peças inserem-se num estilo que explora simultaneamente a meticulosidade dos elementos e a monumentalidade da sua montagem.
Perfecionista, o artista está sozinho no trabalho necessário. Como que hipnotizado pela repetição dos gestos, deixa as emoções emergir e toma plena consciência do momento presente. O objetivo plástico torna-se então claro, mesmo que a forma evolua até ao fim. Grégoire Scalabre não procura impressionar, mas sim colocar-se ao serviço de um meio ao qual deve tudo e que lhe deve tudo.
L’ultime métamorphose de Thétis
L’Ultime Métamorphose de Thétis, exposta pela primeira vez em Veneza na Homo Faber 2022, é composta por milhares de ânforas em miniatura (entre 2 e 3 cm), em tons que vão do branco ao verde, passando pelo bege. Com uma altura de 2 metros, 1,6 metros de largura e pesando 450 kg, a peça é composta por 70 000 ânforas em miniatura, torneadas e esmaltadas uma a uma pelo artista. A obra é uma homenagem a Tétis, a mais conhecida das Nereidas, esposa do mortal rei Peleu e com o coração destruído pelo trágico fim do seu filho, Aquiles. A água e o fogo da cerâmica evocam uma divindade marcada pelo mar e pela guerra. A criação como enésima metamorfose da divindade grega.
Cygnus
O seu notável medalhão de parede em porcelana, Cygnus, é composto por mais de 9000 vasos de porcelana em miniatura, pacientemente colocados na roda por Scalabre. Cygnus inspira-se nos destroços históricos da Companhia das Índias Orientais. Os naufrágios eram frequentes na época georgiana. Entre a carga perdida, havia cerca de 200 peças de porcelana fina proveniente da Ásia. Os vasos individuais de Scalabre convergem e são incorporados numa grande estrutura em forma de coroa, semelhante a cracas num navio. A forma de coroa, que evoca tradicionalmente a eternidade, presta homenagem ao transporte mítico da porcelana, para sempre afastada da humanidade, renascendo nas profundezas do mar.
L’Onde
O elemento mais pequeno da obra é o vaso, que se apresenta sob diversas formas, numa exploração da história das artes decorativas. Para além do aspeto estético, a sua principal função é trazer o jardim para o interior. Sentimos uma alegria sensorial imediata, mas, por esse simples facto, constitui também um símbolo da submissão da natureza à humanidade. Aqui, o artista toma aqui a direção oposta a essa rutura de um ciclo, dessa violência subjacente, impondo aos vasos uma forma da natureza em acumulação vertiginosa, compondo uma ordenação do caos. Esta obra permite-nos também mover-nos e, à medida em que nos movemos, revela-nos estes diferentes níveis de leitura que nos levam da onda, movimento orgânico aqui paralisado no seu impulso vital; leva-nos, passo a passo, ao vaso em contraponto com a sua natureza.
REFERÊNCIAS BIOGRÁFICAS
Grégoire Scalabre é um artista francês, ceramista e escultor, reconhecido internacionalmente pela virtuosidade da sua obra. O seu universo artístico inspira-se amplamente na arquitetura e no mundo industrial, no património arquitetónico dos monumentos franceses e no universo estatuário. Figura atípica na paisagem contemporânea, Grégoire Scalabre testa constantemente os limites da cerâmica. O artista desafia a matéria para oferecer um repertório de formas constantemente renovado: do registo da disseminação e da acumulação, ao do dinamismo e da monumentalidade, passando pela arquitetura e metalurgia.
O seu interesse pela cerâmica remonta à infância. Rapaz com uma imaginação fértil, adora observar, desenhar e consertar coisas que utiliza para contar histórias. Nem pensar em esperar que a aventura venha de fora, ele prefere ter a iniciativa. Ainda hoje, mergulha num projeto tal como no passado construía cabanas para criar o cenário de uma história imaginária. Mas algo frustrado, o jovem Grégoire foi enviado para um colégio interno na Normandia, onde descobriu a plasticidade da argila e a sua transformação. Fascinado pelo poder da água e do fogo, compreendeu imediatamente qual seria o seu caminho. Uma revelação que será seguida por uma aprendizagem no Atelier du Sage, em Dieulefit, na região de Drôme, tendo concluído os estudos teóricos no Lycée de la Céramique, em Longchamp.
Apaixonado pela arquitetura e pelo design, a sua abordagem artística afirma-se rapidamente através da renovação dos fundamentos do gesto na Agir Céramique, e é enriquecida pela formação em química da esmaltagem. Estas iniciativas permitem-lhe desenvolver um domínio técnico e um sentido estético extraordinários. Mas a sua experiência do sensorial não pode limitar-se apenas à prática e Grégoire Scalabre decide enriquecê-la aceitando tornar-se formador de cerâmica na prisão de Bois d'Arcy. Desde então, nunca mais deixou de explorar essas duas vertentes: a criação e o ensino. Em 2000, o Institut de la Céramique Française confia-lhe um workshop de formação em torneamento. Tinha 26 anos. Dois anos mais tarde, funda o seu próprio atelier e, em 2005, cria a École de Céramique, em Paris, com Christophe Bonnard.
No início do seu percurso, Grégoire Scalabre colabora com editores de design e, em 2007, torna-se um dos «talents à la carte» da feira Maison & Objets, mas, no final da década de 2000, abandona o design utilitário para colocar o seu know-how ao serviço de uma abordagem exclusivamente artística. Da residência na Manufacture de Sèvres, em 2009 e 2010, nasce Astrée, uma obra monumental que será exposta no Musée des Arts Décoratifs de Paris no âmbito da exposição Circuits Céramiques (inverno 2010-2011), e Haussmann, uma série de esculturas em modelos de gesso que formam uma verdadeira paisagem arquitetónica baseada no princípio da moldagem de estuque, caraterística do estilo Haussmann. As investigações do ano seguinte incidiram sobre uma série de questões. Como purificar através da desconstrução? Como mostrar o que não existe? Como fazer o olhar viajar não só para o exterior, mas também para o interior da estrutura? Entre outras. Vários destes capítulos criativos estão agora expostos na Galeria Nec em Paris e na Galeria Modern Shapes em Anvers.
Em 2015, Grégoire Scalabre cria, com uma amiga ceramista, o Atelier Céramique em Kremlin-Bicêtre (cujos trabalhos serão suspensos em 2020). A ideia é criar um espaço de partilha, de transmissão de conhecimentos em torno de uma visão contemporânea da cerâmica. São fornecidos cursos e ateliers de torneamento e de modelagem para amadores e para utilizadores experientes, bem como formações para preparação do CAP em torneamento de cerâmica. Em 2017, publica na Éditions Eyrolle a obrra pedagógica Céramique: répertoire de formes. Expandir o seu registo de expressão é uma preocupação constante, que passa por uma curiosidade incansável por novas técnicas. Em 2018, as peças que saem da sua oficina exploram a técnica de projeção de mármore sobre cerâmica. Ainda convencido de que a sua prática pedagógica, nomeadamente profissional, alimenta a sua prática artística, e vice-versa, funda em 2022 um novo atelier de transmissão de conhecimentos e de técnicas cerâmicas, em colaboração com Virginie Mercier.